Universidade e me jogou no mangue , nas casas de barro pau a pique e palha de palmeira. Nas ruas lamacentas,
na falta de escolas primárias e na indiferença dos poderes que deviam minorar
ou mudar este estado de abandono da grande maioria do seu povo. Deu-se então a
minha nova conversão ao Brasil. Deixei a Universidade, peguei os meus poucos
haveres e fui morar num desses bairros pobres de ruas sem calçamento, de gente
sem trabalho, de todo o povo sem qualquer tipo de assistência. Foi uma surpresa
geral para os meus colegas de profissão e para os meus novos vizinhos dos
“alagados”. Padre era coisa que por ali não se via, não porque não houvesse lá
o que fazer mas porque a cidade colonial era mais condizente com o estado
social e talvez até com a sua vocação. Foram tempos difíceis em que tudo teve
que ser criado com os moradores e algumas pessoas da cidade colonial. Tudo!
Desde as escolas ao centro de saúde, aos poucos hábitos religiosos.
Descobriu-se que a solidariedade era um valor e que ninguém estava só no mundo
pois sempre havia uma mão a seu lado. Ninguém foi dispensado de participar
nessa obra. Ninguém. As festas que antes eram particulares passaram a ser de
toda a rua ou até do bairro. A missa dominical de que eles já tinham ouvido
falar nas aldeias de onde vieram tornou-se um momento de celebração coletiva
onde tudo se discutia, aprovava e cumpria. Assim, a assistência aos velhinhos, a frequência da
escola primária, a preocupação com o trabalho e até o bem-estar material de
cada um eram assuntos discutidos na hora
na missa dominical de que todos participavam, rua por rua A minha “conversão”
ao Brasil continuava. É claro que estas mudanças, ou estas novidades trouxeram
consigo invejas que nós não prevíamos, críticas que nada tinha a ver com a
realidade mas a união entre todas reforçava-se dia a dia. Pessoas de outras
paróquias vinham á nossa paróquia não só para ver como era mas também para
participar porque a missa, um batizado, um casamento tinham uma mística que não
existia nas suas paróquias. Até a igreja evangélica que existia na paróquia se
dissolveu e começou a participar com
todo o direito nas nossas ações religiosas e de carater cultural. A autoridade
eclesiástica manteve-se calada durante algum tempo mas pressionada por gente da
igreja e de outos sectores sociais da
cidade viu-se obrigada a intervir sob a alegação de que nós estávamos
ultrapassando as normas da igreja. Em primeiro lugar todos os atos de culto
eram em português: a missa, as leituras, a pregação. Tudo tinha a participação
ativa de todos os crentes. A rua era o lugar escolhido para todas as
manifestações religiosas ou outras que a população desejasse fazer. Quem
discordou desta nova igreja e quis manter os seus laços com a igreja
tradicional mudou de favela voluntariamente. Ao fim de algum tempo a paciência
da autoridade eclesiástica acabou.Eu teria de mudar de paróquia, ou voltar à Universidade.
Eu, porém, tinha um compromisso comigo mesmo e com o Brasil que assumira quando
me converti ao Brasil. Peguei a minha rede e os meus poucos haveres e sem me
despedir de ninguém, morei alguns dias com um antigo companheiro de luta e
depois ingressei em definitivo nas Ligas Camponesas.
Esta é uma história que se escreve com muitos outros episódios, e que vão desde a prisão à tortura e termina com a minha quase expulsão do Brasil pois o país que eu amava e amo declarava-me apátrida.
Apesar disso aminha conversão mantém-se nem a morte poderá mudá-la.
Esta é uma história que se escreve com muitos outros episódios, e que vão desde a prisão à tortura e termina com a minha quase expulsão do Brasil pois o país que eu amava e amo declarava-me apátrida.
Apesar disso aminha conversão mantém-se nem a morte poderá mudá-la.