Carta Vária, porquê?



sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Democracia. Afinal o que é? Como se exerce?


Na Itália , como em Portugal e noutros países democráticos da Europa, a "crise" tem provocado imensos problemas aos governos, parlamentos e outras instituições democráticas. Há sempre uma "troika" a pressionar, os mercados a aterrorizarem, os "sábios" a darem conselhos, os "profetas da desgraça" a pintarem cenários de horror. Vive-se um clima de juízo final antecipado em que "o pão sabe a merda", o vinho parece vinagre, mesmo o alentejano. As vontades amoleceram e só se espera o pior.
Mas, surpreendentemente,  da Itália de Berlusconi chega um raio de luz de esperança. O parlamento e o governo italianos decidiram acabar com todos os municípios com menos de mil habitantes. Razões económicas. Pois bem. Um desses municípios condenado ao desaparecimento desafiou os poderes da República italiana informando-os que a partir daquele momento, por vontade unânime do seu povo se separava da Itália e se proclamava independente, assumindo a forma republicana de governo, à semelhança  da antiquíssima  República de S.Marino. Ora aí está uma forma de espantar a "crise" e restabelecer a democracia directa, aquela em que todos e cada um dos cidadãos se sentem responsáveis e responsabilizados pelo destino da "sua república".
E nem se diga que a democracia directa é campo aberto à demagogia ou ao oportunismo. Não o é. Até porque ela contém em si mesma, os antídotos necessários e eficazes contra estas e outras distorções possíveis. E, sobretudo, não permite  que alguém se perpetue no poder, se locuplete com o seu exercício ou o transforme em trampolim para interesses pessoais. Por isso ele tem limites, que podem ser físicos, cívicos ou comunitários. Se em vez de sempre ou quase sempre estarmos concentrados na contemplação do nosso próprio umbigo, olhássemos à nossa volta com olhos de ver, facilmente constataríamos que há outras formas de viver em sociedade bem mais respeitadoras da vida e de tudo o que a ela diz respeito, incluindo a natureza, do que aquelas que, orgulhosamente, por serem nossas, achamos perfeitas ou mais que perfeitas.
Confesso que gostaria que a febre municipalista e anti-municípalista de políticos e não políticos os levasse a "editar" uma lei semelhante à dos políticos italianos: municípios e freguesias   com um certo número  de tantos mil habitantes deixam de ser municípios ou freguesias. Palpita-me que seria uma boa "guerra" e que se poderia clarificar de uma vez por todas, onde é que reside o poder democrático e  qual é verdadeiramente a sua fonte. Então se conheceria o valor  de certas "figurinhas", qual o seu peso específico na política do país e do lugar que dizem representar. Talvez, por isso, deixem tudo como está, para depois se ver como fica.
Eu sou cidadão eleitor de Alvito, um  pequeno mas antigo município (Sec.XIV), baixo-alentejano, a cinquenta quilómetros de Beja. Nem sei bem como fui lá parar, sendo eu trasmontano. O que é certo é que sou cidadão de lá. É lá que eu voto, é lá que pago os impostos, é lá que resido oficialmente, é lá que recebo os meus amigos, é lá que regresso das minhas andanças pelo mundo.
Ao Município de Alvito e Vila Nova da Baronia tal como a muitos outros municípios deste país, falta apenas a capacidade legal reconhecida de se gerirem por si mesmos, em democracia directa, sem interferências da "Corte de Lisboa", sem a presença indesejada de partidos políticos estranhos aos interesses locais. Estamos  todos fartos de caciques feudais que outra coisa mais não fazem, além de mandar, desmandar e impor suas vontades. Os povos de Alvito, como os de Guadramil, ou Serpa, ou Barca d'Alva, ou de Monção ou ainda de Montalegre já abominam esta democracia autoritária e por isso não votaram. Eles querem é ser ouvidos. Ouvidos e atendidos  nas suas reclamações. Mas, para isso, é preciso ter poder real. A última vez que isso aconteceu em Portugal foi nas Cortes que confirmaram D. João II como rei de Portugal, no final do sec.XV. Cinco séculos sem mais ser ouvido e atendido é demasiado tempo. Ou então, quem sabe, esta nação de mil anos, transformar-se-á num espaço político de mil repúblicas.