Senhor
Presidente:
Ao
mandar prender Luaty Beirão e os 14 ativistas, que estão até agora encarcerados
sem culpa formada, não devia saber que um homem se quiser pode resistir e
sobreviver vitoriosamente a qualquer forma de opressão.
Não
devia saber porque se esqueceu. Esqueceu que já foi jovem, que já lutou por
ideais. Ideais de liberdade de democracia e bem-estar social. Esqueceu tudo porque
infelizmente o seu país é o exemplo contrário de tudo isto. É uma ditadura
cruel, um valhacouto de ladrões, uma associação de interesses mesquinhos,
melhor dizendo, um país sem povo. Quem lho afirma é alguém que durante dez anos
esteve preso, sobreviveu às greves de fome e à tortura. Esta é a afirmação de
um homem que esteve disposto a morrer por aquilo em que acreditava. E digo-lhe
que um homem pode ser triturado pela máquina do terror que a sua condição de
homem sobrevive, pois todo o homem pode manter-se vivo enquanto resistir.
A
luta dos jovens angolanos é um libelo contra a opressão como forma de vida
política, contra o silêncio das mordaças, contra todos os processos de aviltamento
dos seres humanos, contra a corrupção ideológica. A luta dos jovens angolanos é
a constatação de como o arbítrio avilta os indivíduos e as instituições,
corrompendo-os pelo abuso do poder, pela falsa certeza da impunidade, pela
imposição imoral de uma vontade sem limites, pelo silêncio indigno, pela
conivência criminosa, pela omissão filha do medo, em que o silêncio do terror tem
que ser aceito como paz social.
Se me
atrevo a dizer-lhe tudo isto é porque Angola fez parte do meu ideário político
e das minhas preocupações revolucionárias e muitos revolucionários angolanos foram
meus amigos. Quando parti de Portugal para o Brasil devia ter partido para
Angola, mas já nesse tempo as condições da minha ida não foram possíveis,
devido às minhas ligações com a resistência angolana. No Brasil, colaborei com
a resistência angolana e fui seguindo os seus passos como pude a té porque eu
já estava umbilicalmente ligado à resistência brasileira. Mesmo assim, à minha
única filha, coloquei o nome de Luanda.
Senhor
Presidente, é tempo de não se deixar enredar por intrigas palacianas, por
intrigantes gananciosos, por saqueadores de todo o tipo. Quando esse saque
acabar o único responsável será o senhor. Se tiver ainda um momento de reflexão
possível recorde-se dos seus tempos de jovem quando a revolução do seu país lhe
ocupava a sua força, a sua inteligência e todas as suas capacidades. O tempo em
que provavelmente era feliz.
Como
sabe, o poder tanto pode chegar aos que dele abusarão como àqueles que o usarão
com legitimidade a favor dos seus povos. Mas só os poderosos podem ser magnânimos,
cometer actos que aos outros mortais não são possíveis Tem agora tempo de ser
magnânimo: retire os presos da prisão, ouça-os e depois peça-lhes desculpa. Eles
merecem.
Lisboa,
18 de Outubro de 2015
Alípio
de Freitas